domingo, 27 de dezembro de 2009

Tenho medo do céu primitivo
Temo as suas cúpulas de ouro
Que se dilaceram em farpas d’alma
Perfurando-me o âmago de ser
E a origem da minha vida irada.

Sonho mudo, em carreiras perdidas
Algures...
Entre a amizade e o pranto
Do mito do Esperanto
À inócua incompreensão universal.

Não supero o algo que me alimenta
Escoando no súber a negra oferenda
Que me tortura em lagos de prata
E me sonha como o nada que embala.


Charneca de Caparica, 2005

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Doce trindade

Os teus olhos são mel
Triplo mel que me envolve
Que em luz me devolve
O doce calor do prazer

Olhar-te é viver
Um sonho d’oiro puro
Sonhado no meu escuro
Vazio de negro fel

Íris de triplo anel
Magia onde me perco
Onde finalmente cerco
Um puro e pueril doce

Maior ainda fosse
O que nos separa,
Nada, nada se compara
Ao calor que ainda sinto

No altar onde não minto
És deusa do meu ser
Espírito do meu querer
Em sublime forma de mulher

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Lágrima dourada

Retinge-me, lânguida,
Oh, lágrima dourada.

Lágrima porque dóis
Na longa madrugada
Porque contaminas o prazer
Da suave independência
Com laivos de querer
E saudade sem clemência

Percorre-me a facies,
Oh, dourada lágrima.

Dourada porque bela
Sublime (Incomparável) obra prima
É esta forma de amar
Os teus lábios, tão ternos
Que te permitem beijar
Superando (mesmo os) mares eternos

(Boston,2003)

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Fim

Na paisagem serena do fim
Um vento quente me envolve
Com aromas de nostalgias
E o sentir que se dissolve.

No pó do que outrora
Foi montanha sobranceira
Por Lavoisier e “Tao“
Consumida por inteira
Em erosão de mentiras
E traições, que neste ver
Se nivelam em brincadeira.

Agora a luz de anã
Nada aquece, mas ainda
Brilha, como eterna
Flama fria, que
Só se extinguirá
Cumprindo sua sina
Que a ceifeira levará.

E foi em ti que descobri
O que é sentir Amor
Sem literatura
Sem cobrança
Sem mesura a trinar
Sem esperança a alcançar.

domingo, 15 de novembro de 2009

O Olho

Como me trespassas de emoções,
Neste louco desvario sentido,
Que julgas serem fruto, ilusões,
De medo e perda de amor sofrido.

Embaídas, tens tuas opiniões.
Pois a causa do inane alarido
É a certeza de dois corações
Que emanam um sentir unido.

Sentir teu toque na noite quente
Roçando o beiral do abismo
Foi prova chorada e potente

De que comigo queres ficar
E, passando este longo sismo,
Um novo lindo amor terá lugar (?).


(Charneca de Caparica, 2009)

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Crueldade

Arranhas me o coração
Com garras de nojo e fel
E sacodes o teu papel
Na minha ímpia degradação

Sou barro crivado de sal
Cujo toque chagas abre
Fio sangrento do meu sabre
Ardendo em espasmos de mal

Sei que mil vezes morrerei
P’ra teu doce travo sentir
Por seda, ferrões sofrerei

E, se das trevas não subir
Laços de dor enviarei
E a meu lado te ver cair

(Charneca de Caparica, 2009)

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Ferido na corda

Teus olhos de lago
São fios de lâmina
Trespassam o meu ser
Com frieza metal
Tuas lágrimas, doem
Ácidas, e corroem
O que sinto e sou
Matam o que desabrochou

Palavras de adeus
O olhar, distante
Cortam-me a vida
Como horrendo diamante.


(Charneca de Caparica, 2009)

domingo, 18 de outubro de 2009

Conversas não

No verde plano, envolto e só,
Observo a montanha, que acolá
Se ergue, alva e imensa,
E vejo a tua face, branca,
Mas não é a tua face, doce.
E olho para os teus olhos, verdes,
Mas não sinto o teu olhar, em mim.
E contemplo o teu peito, nu,
Mas vislumbro as tuas costas.
E miro os teus joelhos,
Mas são os teus calcanhares
Que lentamente te afastam...
...de mim.

Marejam-se-me os olhos de
Gravíticas gotas salgadas.
Ao explodirem no chão, verde,
...sempre verde.

Ouço o ribombar da tua voz:
"Não estou para conversas! Não!!"
O eco ressoa no plano,
O eco ressoa um ano.

E a montanha que eu via, acolá,
Ainda lá está… mas não está para mim.


(Lisboa, 2009)

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Árvore sem folhagem, ouve o meu pedido,
De longo restolho fendido,
Imploro a tua sinceridade...

Humilde,

rastejo,

Na sublime sinceridade,
De um sobrolho de um velho
Face à candida, cruel, verdade.

Peço
o Mar sem anéis da lástima dourada,
Peço
o Ângulo sem papéis, sem a púdica amizade

Peço
o Grânulo de mim em calmarias desperto

Quero o sonho de, por fim, ter Ângulo e ter Mar... e que não me cravem unhas no peito aberto.



(Boston, 2004)

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Devaneio rubro

Gáudio de vista
É o lembrar-te, Lira,
Trinando minh’alma
Em redemoinhos de mel

Orgiástica ventura
Libertária, suprema,
Tua mão, minha pena
Oh ausência dura e cruel

Suposição de loucura
Granada que, por amor,
Explode em águas profundas
No abismo frio e escuro
Onde monstros sanguinários
Vivem, sofrem, doem,
Morrem...
Sob os cascos fendidos das Fúrias
Sob as derrocadas, longas e despojadas,
De personas lúgubres e mirradas.

A altitude enjoa, agora.
Oh Corpo de Gigante Irado
Enebriado de sal e gemas
Jóias de luz esperançada,
Cor, símbolo de vida
Chaga de inconsciências aveludadas.
Oh, Vôo de ave cega e desdenhada.

(Lisboa, 2004)

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

?Original

“Chove lá fora”
Como início de poema
Nada tem de original
Começando p’lo tema
Nada neste colabora
Para uma arte desigual

“São anjos que choram”
Assim o poeta diria
Eu, jamais fui tal
Lágrimas de maresia
Na minha face rolam
E a chuva não tem sal

“Anjos alvos que agora”
Anjo, conheço uma
É demónio por igual
Lembro-a na doce bruma
Onde mia paixão mora
Céu, inferno pessoal

“No meu coração moram”
Nada mais tem guarida
Que o meu sangue vital
Memórias tuas, querida
Belas, gloriosas, decoram
Todo o meu córtex cerebral


(Boston, 2001)

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Contemplativo desespero

Estou só
Solto
Etéreo por sobre mim
Contemplo-me pesaroso

Contemplo-o

Liberto
Imaterial
Componho a massa lenta
De uma emergente empatia

Por ele... por mim

A Dor
Partilho
Ele revê-se na não-dor
Esta reprime com pudor

Vazio

Amorfa
Pesada
É esta empatia p’lo desespero
Emudecido, mas presente

Sinto-o

De fora
De mim
Revejo labirintos de
Mentira, de rubro sangue

Derramado

Tão só
Tão sua
Que lágrimas apenas escorrem
Na íntima face de dentro

Da alma


(Boston, 2002)

terça-feira, 1 de setembro de 2009

A minha dor

Lágrimas inconstantes
Humedecem a neblina
Que, como uma mão extremosa,
Afaga as lápides com os
Gélidos dedos da ausência
De Amor...

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

?

Porque me sabes a maresia nocturna?
Acreditas no mistério?
Sentes os orgãos do amor em sinfonia?

A respostas não me submeto, pois a longa espera foi desabrochando em camadas, pétalas de néctares e manás (não mais serei o ontem ou o amanhã); vi o sol quebrado em mil pardais, chilreantes e travessos... levei o sonho ao fim do sal, em bandeiras abotoadas ao meu longo cabelo gutural.


(Caparica, 2005)

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Hedonista, percorro
Os vales e campos do teu
Olhar
Alago-me em torrentes
Do teu doce e longo
Néctar,
Envolto na tua alva e quente
Paixão.
Do topo do monte Êxtase
Sobreponho a sinceridade
Da luz e cor de Nós
Num toque sem fronteiras,
Num mar sem barreiras,
No mais louco sonho... voar!

(Caparica, 2004)

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

O longe, agreste, sereno
Mar
A dor, celeste, amena
Voar
Morrer sem...
Ser, alguém,
sonhar...
Engano puro de paixão; que vida tudo permite?

Organizando o nada.............


(Carcavelos, 1999)

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Lembrai os choupos azuis,
Orando ao vento.
Recordai os cavalos
Trotando orgulhosos
Sobre o mar bravio.
Sentí as carícias veladas
De uma brisa de estio
Libertai pombas de dor
Da superfície nua
Libertai-as por amor
E a arte será tua.

(Carcavelos, 2000)

sábado, 8 de agosto de 2009

Mãos

Fixo-as apenas
Não as metaforizo, não as canto
Não me perco em vãos poemas,
Em longos e tediosos temas,
Em colunas de alabastro
De sonho mármore cravadas,
Descobertas ou pintadas
Longas como cordas ancestrais.

Olho-as, nada mais...

...um pouco mais confesso
Breves clarões sensuais
Que nem chegam a pensamentos,
São luzes, são vitrais,
Matizes de fantasiar.
Meu corpo percorrem
Ao som de um toque irreal
Ondas surreais e concêntricas
Emanam da luz, que assim
Se reflecte, na sua forma divinal.

(Lisboa, 2004)

domingo, 2 de agosto de 2009

O aroma do chá

Gotas puras de prazer
Lacrimejam do ouvido
Para o âmago do sentir meu
Na enebriante melodia
Da carícia de quente água
Sobre a alva porcelana.
Perco-me então
No voluptuoso movimento
Das folhas de caos,
Enquanto o aroma
...dança
Na base do meu olhar
Antecipando
...o sabor primeiro.
Sinto a transparência de gema
Da líquida jóia ancestral.


(Boston, 2001)

sexta-feira, 24 de julho de 2009

À lupa

S
OU
UMA
LUPA
DEMI
MPR
ÓPR
IO

g
ot
eja
ndo
emplá
cidaca
ndura

reveloomaisprofundo
abismodesalojadodaminhasensibilidade ampliocomoumamágoaaliberdadedesentiroquedespontadaloucuradetermente

(Boston, 2002)

quinta-feira, 16 de julho de 2009

A tempestade

Recortada na alva neblina
Perscruto, suave e lânguido,
Sinais do sentimento perdido,
Algo... em teu olhar de felina.

Salgado e só, navego à bolina
Com o altivo mastro partido
Contra a dor do vento temido:
Tua indiferença de menina.

Irai, ó espumas de sofrimento
Pois minha quilha não vergará mais
Sonhai com ondas de sentimento

Montanhosas, danadas, animais,
Dilacerando o negro momento
Mágoa, olhos, líquido... e sais.

(Carcavelos, 2003)

segunda-feira, 13 de julho de 2009

O Sol por entre agulhas...

Viajando na tundra do teu regaço
Lamparina exangue do meu sentir
Autoria de imensa liberdade
Sinfónica e profunda alegria

Enganando o sonho de folia
Sentindo a maresia salgada
Pleno de sentido, som sumido
de magia antiga, ritualizada

Sinto-me o deus das coisas que vemos...

(Figueira da Foz, 2004)

quarta-feira, 8 de julho de 2009

A luminosidade do mar
Desperta-me, e alonga, em mim
Uma súbita percepção
De prata e retorcido latão.

Enferrujando por dentro
(oxidação de alma só...)
Perpetuo a limalha de pestanejar,
Absorvo a lágrima, escura e fria.

E na oblíqua luz me perco
Sem remédio e sem perdão.


(Carcavelos, 2003)

domingo, 5 de julho de 2009

Dói-me
O suave brilho da sua alma
Quando a sacra luz que emite
Não incide sobre mim.

Dóis-me
No eco das tuas palavras
Escoando
em crescente intensidade
(improvável eco exponencial)
Nas cavernas das minhas tempestades

Magoas-me
Com afiadas carícias,
Provindas do teu revolto ser
(Profundas, negras,... penetram-me)
Com o rebentar das ondas de variação
do teu corpo mulher

[Matas-me porque te adoro
E com esta morte, posso eu bem
Pois, como disse alguém
“O inferno... é já não amar”]

(Carcavelos, 2003)

quarta-feira, 1 de julho de 2009

EMPALADO

Na dor de não te ver
Fito com olhos mortos
O ermo toque da tua ausência.
A minha essência escorre
Para o solo, negro,
Que absorve, lânguido e
Com absoluta indiferença.
Ouço, apenas, a tua lâmina
Cortando-me por dentro,
Recortando no meu ser
Labirintos de sofrimento.

Quero afagar-te, rosa, até que uma gota de rubi emoldure o meu gesto vão.


(Carcavelos, 2001)

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Distante

Inclemente exílio
Que impõe essa vontade
Essa premente necessidade:

Nenhum outro povo tanto gosta
De gostar da sua terra
Que, de pronto, se desterra
Para, na distante tortura,
Chorar, beirando a loucura,
A saudade assim composta.

Boston, 2003

sexta-feira, 19 de junho de 2009

(sem título)

Algoz sou eu,
Sou límpido,
Serei ateu?
Sendo louco por te amar.

É Deus, teu ser,
O teu olhar.
Saboreio
A lânguida sinceridade

Do que sinto,
do que seja
O que beija
O som do teu longínquo troar.

(Boston, 2004)

quinta-feira, 18 de junho de 2009

O óbvio

Claro que conheci a destreza dos sonhos. Aprendi tanto, nesses largos vôos. No início era cair, admito-o. Ao saber, ter a certeza, atirava-me de cabeça, de plataforma elevada e coesa, e mergulhava para o fundo, sem temer nenhum mal. Nunca temi engano letal. Sabia-a, sentia-a, a certeza de saber que sonhava, na orgia do impossível, na observação rigorosa e crítica das dobras do irreal. E quando a janela batia, sozinha, eu corria antes que o onírico partisse, e me prendesse na realidade enfadonha. Nada me impedia então... saltava... libertando-me na atmosfera fingida, puxado por uma gravidade inexistente. Descia em longos e ínfimos temporais. Ao tocar o chão, nem sempre surpreso, por vezes, levantava-me, intocado por leis da física racional; noutras almas, em fugazes, e agora irrepetíveis, coroas de infância distante, sonhos meninos, mergulhava em diferente dimensional, todo branco, luz homogénea e fria, pejado de doces alegorias em formas geométricas (cubos, cilindros, cones) multicolores e miméticos de um mar sem luz nem sal.

(Caparica, 2005)

quarta-feira, 17 de junho de 2009

A linha

Serei linha da margem calma
Ondulando seguro e doce,
Em viagem ao horizonte
Que me promete o augúrio,
Longo e sonho, de ser eu só:
Unido ao que transparece
Do reflexivo diamante...
Luminoso, suave e liso,
...sem mácula, sem grão pó.

(Oeiras, 2009)

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Lago mudo e negro

Lago mudo e negro,
Quanta comiseração emana
Da tua pupila de ébano...
Seixo, frio, na minha mão
Ordem corrompida, semi-caos temporário
(Ao tocar a curva superfície da perfeita água, a ordem local é subvertida por espasmos de formas, espumas cinéticas, estranhas danças caóticas de universos de moléculas... por escassos segundos apenas; logo, ainda antes da seguinte revolução, o tecido universal ordena círculos concêntricos, perfeitos, que se expandem à velocidade do belo)
Beleza geométrica, maravilhosa dor eterna...

(Escócia, 2003)